Trocar de carreira aos 40? Não tem idade para mudar!

Renata Barrozo Baglioli decidiu dar uma guinada na sua vida profissional depois de mais de duas décadas advogando em direito corporativo. Com uma carreira estabelecida no mercado, decidiu escutar sua criança interior para seguir um sonho que estava adormecido há anos. Foi assim que iniciou sua trajetória na literatura, ainda na pandemia, e agora já tem cinco livros no currículo.


Escritora em tempo integral, ela escreve para todas as idades. As primeiras publicações foram focadas no público infantil, inclusive, ela também se tornou contadora de histórias. “Tenho um cuidado muito especial com a temática, gosto de trazer leveza e sensibilidade, afinal, as crianças estão em formação e acho essencial cuidarmos da linguagem e da abordagem”, afirma.


Mas agora a autora está voltada para os adultos com o título De Salto Alto, um conjunto de crônicas que analisa as contradições presentes nas relações humanas. “Na temática dos adultos, a linguagem é mais direta, ainda que fluida, e apresento os retratos de cenas que tanto caracterizam o gênero contos, de forma nua e crua, sem rodeios e sem adjetivos”, explica.


Leia abaixo a entrevista completa com Renata, que detalha a produção mais recente, explica sua relação com o universo infantil e aborda como trocou a advocacia pela literatura:


1 - “De Salto Alto” tem mais de 40 contos que abordam sentimentos universais e questões cotidianas das relações humanas. De que forma você acha que esses textos podem impactar outras mulheres?


Renata Barrozo Baglioli: Gosto de escrever sobre sentimentos e relações cotidianas para que todos os leitores possam se conectar, de uma forma individual, com o texto. Acredito que meus contos no livro De Salto Alto não se limitam apenas ao universo feminino, mas, sem dúvida, minha linguagem é mais próxima deste público, o que pode gerar uma identificação maior das mulheres com a obra, já que a voz dos contos é feminina, essa é a perspectiva em foco. Meu propósito com a escrita é despertar o “eu” mais profundo do leitor. Quando meu texto consegue mexer com o leitor, entendo que atingi uma camada mais profunda, em que ele se confronta com seus preconceitos, julgamentos, sentimentos, e que, a partir de um outro ângulo, pode sair da leitura modificado, impactado. Assim, me deleito com este poder transformador da literatura e tenho isto como norte.


2 - “De Salto Alto” também é o nome de um dos contos do livro, que trata da relação entre um filho e a mãe. Por que dentre tantos, você decidiu colocar esse conto como título do livro? O que ele representa?


R.B.B.: O conto que escolhi busca abordar, de forma sucinta, muitos sentimentos conflitantes na dinâmica da relação entre mãe e filho. No caso do retrato da cena que pincei para reproduzir no conto, a temática aborda o fim de um casamento, a superproteção da mãe em relação ao filho, o abandono, a rejeição, e como tudo isso tem um reflexo direto e que dialoga com os relacionamentos do filho com seus futuros parceiros(as).


Entrando um pouco no mundo das dinâmicas familiares, que é um tema que eu gosto muito de abordar, sabemos que os pais têm muita responsabilidade na criação dos filhos e minha predileção por este conto, que dá nome ao livro, é justamente para trazer a importância deste papel (dos pais) e da necessidade de nos perguntarmos como estamos criando nossos filhos para superar a validação e projeção de nossas próprias expectativas neles.


3 – A obra destaca os breves instantes que podem passar despercebidos pelas pessoas e lança um olhar para aquilo que costuma ser esquecido na nossa memória. Qual a importância de falar sobre esses momentos tão humanos e tão comuns no cotidiano?


R.B.B.: Na correria do dia a dia acabamos ignorando as lições diárias que a vida nos proporciona em todos os sentidos: compaixão, liberdade de escolhas, diversidade, sentimentos positivos, e mesmo aquelas ligadas a perdas, como, morte, doença, tristeza, desamor. Nosso imediatismo, aliado a um mundo cada vez mais virtual, acaba por nos afastar das pessoas que amamos e nos desconectar de nossa essência. Assim, acabamos vivendo as coisas pela metade, de forma superficial e pouco empática. Falar sobre os sentimentos, nominá-los, estimular o autoconhecimento e atitudes empáticas são formas de acessar nossa conexão com o mundo interior e com a humanidade, e a literatura é uma importante linguagem de conexão.


4 - Você era advogada e, desde 2021, decidiu mudar e focar na produção literária. O que a levou a optar por esse caminho? O que você aprendeu nesses últimos dois anos?


R.B.B.: Atuar na advocacia foi uma bela escolha e fui muito feliz nessa profissão. Contudo, com a sensação de finitude que a pandemia nos trouxe, entendi que era o momento certo de tomar outros rumos e apostar em um sonho de infância. Escrevo poesias desde pequena e sempre vi a literatura e o processo de escrita como uma forma de atingir o autoconhecimento e a cura (e evolução). Revisitei meu propósito ao longo dos últimos anos e me assenhorei da profissão de escritora com a qual eu sempre sonhei.


Na advocacia, me sentia muito presa a conceitos e julgamentos, e isso estava me tornando uma pessoa mais “quadrada”. No meu entendimento, a vida é para ser vivida plenamente; não podemos nos levar tão a sério, mas, ao mesmo tempo, somos responsáveis pelo que semeamos. Vi na escrita uma possibilidade de trazer equilíbrio para esta equação e deixar um legado para as crianças de todas as idades (tenho leitores infantis e adultos). O que aprendi nos últimos dois anos? Muita coisa que não está nas leis...


5 - Você também é autora de livros infantis e faz contação de histórias em escolas. Qual sua relação com o universo infantil? O que a aproxima dessas narrativas para o público infantil?


R.B.B.: Meu primeiro livro publicado foi Diogo e a menina-sem-nome (2021), ainda que eu tivesse em mente escrever apenas para o público adulto quando decidi adotar exclusivamente a carreira literária. Foi com essa obra que eu desabrochei como escritora e me descobri como “contadora” das histórias de minhas obras nas escolas. Esse acabou sendo um processo muito natural e espontâneo, e, quando me vi falando com as crianças, eu estava sorrindo e realizada.


Acompanhei muito de perto as aulas escolares durante a pandemia – no formato remoto, quando meu filho estava com seis anos e em processo de alfabetização. Isso me fez perceber que eu poderia somar no processo de aprendizado das crianças. Os temas que trabalho nas obras infantis têm muito a ver com o universo que meu filho Bernardo me proporciona. Busco inspiração no que ele está vivendo (dilemas, experiências, aprendizados, medos) e quero ajudar outras crianças a superarem desafios por meio da imaginação, de forma lúdica, mas sem se afastar do mundo real.


6 – Que paralelos podem ser traçados entre sua produção literária para o público infantil e para o público adulto? E quais são as principais diferenças?


R.B.B.: Como eu gosto de dizer: minhas obras são para as crianças de todas as idades, mas as perspectivas são muito diferentes, embora os assuntos sejam muito parecidos (com diferentes graus de complexidade). Nas obras infantis, tenho um cuidado muito especial com a temática, gosto de trazer leveza e sensibilidade, afinal, as crianças estão em formação e acho essencial cuidarmos da linguagem e da abordagem. Já na temática dos adultos, a linguagem é mais direta, ainda que fluida, e apresento os retratos de cenas que tanto caracterizam o gênero contos, de forma nua e crua, sem rodeios e sem adjetivos. A imaginação e entonação cabem ao leitor!


Sobre o autor: Formada em Direito, com pós-graduação em Direito Societário e MBA em Administração, a paranaense Renata Barrozo Baglioli percorreu uma extensa trajetória na advocacia empresarial. Mas, em busca de se reconectar com suas paixões, decidiu mudar de carreira e se tornar escritora em tempo integral. Em 2021, começou a estudar sobre produção literária e iniciou um projeto voluntário de contação de histórias nas escolas públicas e particulares de Curitiba. Publicou cinco livros: “Diogo e a menina sem nome”, “Diogo e a menina colorida” e “Diogo e o irmão do meio” são de uma série voltada para o público infantil, enquanto “A Última Camada” e “De Salto Alto” são duas obras de contos para adultos.

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